quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Tekken


Realizador: Dwight H. Little
País: USA
Ano: 2010
Elenco: Jon Foo, Kelly Overton, Cary-Hiroyuki Tagawa, Ian Anthony Dale, Tamlyn Tomita, Candice Hillebrand, Luke Goss, Gary Daniels, Mircea Monroe

Resolvi dar uma pequena pausa aos filmes asiáticos visionando um filme plenamente inspirado numa arte em que os japoneses excelam: Os videojogos. Os filmes adaptados de jogos de combate não representam qualquer novidade e parecem ter-se tornado num género próprio. Filmes dos 90 como o Street Fighter do Van damme ou o Mortal Kombat do Christophe Lambert representam para muitos um prazer culpado que se aprecia por critérios muito próprios. Esses parâmetros subtis definem a diferença que separa o estatuto de filme de culto do primeiro Mortal Kombat do estatuto de bosta lendária de Mortal Kombat 2. Obviamente tal apreciação só poderá surgir numa mente juvenil altamente pervertida pelos filmes de kung-fu low budget e pelos famosos action heroes que são o Steven Seagal, Chuck Norris ou Jean Claude Van Damme. Apesar da minha pertence a esse grupo de virilistas xungas ser muito parcial, julgo entender suficientemente os códigos do género para fornecer uma opinião crítica capaz de ir para além do mau que é inerente a esse tipo de filme. Os que aguardam por um milagre podem desde já abandonar qualquer esperança, o filme é tão mau como qualquer outro filme do género.

Na altura em que a adaptação do Tekken foi anunciada ninguém parecia estar à espera dele. Se o filme tivesse visto a luz do dia 7 anos mais cedo o impacto teria sido claramente diferente mas numa altura em que a série mostrava já claros sinais de declínio e o filme do Dead or Alive tinha nos feito jurar para nunca mais, poucos foram os que se entusiasmaram pela notícia. Os próprios filmes de videojogos, gastos pelos sucessivos fracassos, são já condenados a mediocridade pela opinião pública.

O videojogo do Tekken é por sua vez um franchise bastante reconhecível para todos aqueles que viveram os tempos da primeira playstation. Grandemente inspirado pelos Virtua Fighters, o jogo revolucionou os padrões instigados pelo Street Fighter e tornou-se num mito no mundo dos videojogos. Apesar dos guiões dos jogos de luta serem habitualmente bastante maus, Tekken surpreendia pelo seu universo tanto grotesco como complexo. O dilema familiar do império Mishima só poderia ter comparação com as piores telenovelas mexicanas. Pandas guerreiros, Kangurus assassinos com luvas de boxe, lutadores Americanos com penteados que desafiam a gravidade, robôs plágios de Frankenstein, samurais mascarados como no carnaval e nativas americanas de ascendência chinesa são algumas das figuras folclóricas que animam as complexas e hilariantes aventuras do universo do “punho de ferro” (Tekken). Um material tão grotesco não poderia certamente ter acabado nas mãos dos estúdios cinematográficos por qualquer outro motivo do que o simples desejo de conseguir dinheiro fácil.

Voltando à minha introdução, resolvi expor esta adaptação aos critérios que julgo serem os principais factores de sucesso ou fracasso do género: A fidelidade ao universo, a caracterização das personagens e a qualidade dos combates.

O filme introduz um futuro apocalíptico onde os governos e os seus Estados caíram progressivamente em declínio mergulhando o mundo no caos. O poder caiu num punhal de grandes multinacionais que agem como ditaduras e fazem figura de únicas garantes da paz. A mais preponderante dessas empresas é a Tekken, uma potência comercial liderada pela família Mishima e que tem como particularidade o seu torneio anual de artes marciais, o chamado “King of Iron Fist”. Jin Kazama é por sua vez o filho único de uma mãe solteira que tenta sobreviver, como todos os jovens, a um universo hostil onde os seus conhecimentos de artes marciais são a sua melhor vantagem. O dia em que a mãe do Jin é violentamente assassinada pelos soldados do Tekken, o rapaz descobre a ligação da sua mãe ao império marcial dos Mishima e resolve integrar o torneio na esperança de a vingar.

Os mais experientes terão desde já reparado na flexibilidade com que o vocabulário da série foi aplicado. A famosa Mishima Zaibatsu é aqui intitulada pelo nome japonês do torneio enquanto a tradução faz aqui ofício de título oficial. Esse detalhe relativamente insignificante não deixa porém surgir uma primeira falha de grande importância: O conceito de Zaibatsu. O wikipedia sendo o melhor amigo dos que ainda não sabem, essa designação japonesa é importante para entender o poder do mitos desses monopólios induzidos e a sua filiação com antigas famílias samurais. Num país maioritariamente governado ao longo da sua história por uma nobreza marcial, a noção de um império económico liderado por uns malucos da porrada é certamente mais contextualizada para não dizer compreensível. Porém querer transcrever essa subtileza sem querer preservar a sua auto-derisão era certamente missão impossível. Nesse aspecto o filme safa-se razoavelmente sem porém nunca conseguir justificar a importância desmedida do torneio na liderança da população.

A fraqueza do filme nesse aspecto reside principalmente na forma como tudo é encerado no mesmo espaço e a forma como as personagens se deslocam nesse mesmo espaço de um sítio para o outro sem grandes justificações ou consequências. Os combates organizam-se numa arena modernizada à semelhança do que poderíamos esperar de um UFC futurista e pouco mais. As necessidades orçamentais terão certamente condicionado essa decisão mas não a justificam de forma alguma.
Uma imagem vale mais do que mil palavras

A caracterização das personagens é por sua vez a maior fraqueza do filme. Primeiro porque o punhal de lutadores escolhido deixa de fora muitos dos mais memoráveis e segundo porque o seu desenvolvimento limita-se à simples aparência. O desenvolvimento pessoal é praticamente inexistente. Jin é interpretado pessimamente e não transmite nem emocionalmente nem fisicamente qualquer carisma. Heihachi Mishima, tradicional filho da “meretriz”, é aqui uma espécie de Mr Myiagi que apesar dos notáveis esforços do lendário Hiroyuki Tagawa é terrivelmente debilitado pela sua caracterização patética. Quem vislumbrar a coroa de cabelo branco e as sobrancelhas desproporcionadas só poderá concluir que a equipa do filme estará próxima da cegueira. Essa incapacidade em distinguir os elementos de caracterização indispensáveis dos dispensáveis está presente em quase todas as personagens. Kazuya é aqui o perfeito oposto do seu pai por ser completamente irreconhecível em relação à sua representação no jogo.

Por outro lado, os trajes no filme não representa, nada mais do que uma farda colorida à imagem do que se faz no Wrestling. No jogo quase todos os combatentes possuem uma profissão paralela à sua actividade de lutador. Todos são animados por objectivos individuais e a sua personalidade assim como interacção são bastante singulares. Fora a Cristie Monteiro, que faz aqui o papel de love interest e primeira mulher a fazer do seu rego um decote, todas as personagens são psicologicamente semelhantes e com diálogos que não dizem nada sobre a sua personalidade. O filme do Street Fighter, apesar de o fazer de forma ridícula, conseguia pelo menos transmitir personalidades próprias a cada personagem.

Resta-nos então a questão dos combates. O que diferencia principalmente o filme adaptado de um jogo de luta com um filme de “action-heroes” tipo bloodsport reside principalmente na ausência de “perfomance”. Apesar dos movimentos dos lutadores serem de facto inspirados no jogo, nada os torna particularmente entusiasmantes tanto na encenação como no seu valor marcial. Fora o breve intervalo de capoeira do mítico Eddie as sequencias de acção são previsíveis sem nunca porém caírem no falhanço total. Tendo em conta as adaptações já existentes, o filme situa-se na média inferior. O que as fazem serem inferiores aos combates de um Mortal Kombat deve-se precisamente ao facto do cenário dos combates ser sempre o mesmo. A utilização dos elementos externos e a transição da floresta para o “inferno” na luta entre o Johnny Cage e o Scorpion no Mortal Kombat são exemplos de elementos que amplificaram a percepção positiva do combate. Essa ilusão ausente no Tekken teria permitido criar mais suspense e cortar com uma certa monotonia.

Em conclusão o filme Tekken está longe de revolucionar o nível qualitativo das adaptações de jogos de luta. Surge como um parasita fora do tempo que não destoa com as produções passadas mas que sofre da sua contemporaneidade tanto no padrão cinematográfico como na popularidade da própria licença. O filme consegue ainda assim escapar ao aborrecimento e é portanto recomendável aos fãs da saga desde que esses o façam por aquelas vias que enfadam os direitos de autor.

Nota: 2/6 




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