sexta-feira, 29 de julho de 2011

Shaolin


Realizador: Benny Chan
País: China – Hong Kong
Ano: 2011
Elenco: Andy Lau
, Nicholas Tse, Fan Bingbing, Wu Jing,Yu Shaoqun, Jackie Chan

O filme de arte marcial é sem dúvida o género mais popular do cinema asiático no ocidente. Quem não recorda a tremenda popularidade dos filmes do Bruce Lee na década de 70 assim como o percurso de outras grandes estrelas como Jackie Chan ou Jet Lee. Essa longa vaga de produção made in Hong kong aculturou progressivamente o ocidente às artes marciais e aos famosos monges budistas do templo Shaolin. Com um casting de estrelas, um realizador vedeta e um orçamento consequente tudo indicava que este seria um dos grandes blockbusters chineses do ano (e é muito provável que assim aconteça).

Existem a meu ver dois tipos de filmes de artes marciais chineses: O da China lendária e o da China “moderna” (1700-2000). Na minha opinião o primeiro género é menos interessante em termos de marcialidade por envolver demasiados “bailes aéreos” mas é mais interessante pela sua carga poética e o seu conteúdo relativamente livre de propaganda. Por outro lado o segundo género apresenta muitas vezes autênticas “perfomances” marciais associadas a um guião caricato, revisionista e xenófoba dos “brancos” e dos japoneses.

Como tal abordei o filme com a mente aberta, pronto para ver um desfile de professores universitários americanos blasfemar o Stanislavski ao declamar frases de vilões de desenho animado. Desde que o espectáculo “circense” fizesse o seu trabalho a densidade de guião seria o pequeno extra para atingir o estado de graça conseguido pelo excelente Fearless.

O filme decorra algures no período decadente dos “Senhores de Guerra” (1916-1928), um tempo em que pequenos chefes militares se disputam território e dinheiro no meio de uma população aterrorizada e faminta. Hou Jie é um desses senhores de guerra. Arrogante, cruel e sem piedade, o homem é um general talentoso que ambiciona por cada vez mais poder. Triunfando sobre um dos seus rivais, Hou Jie e o seu jovem ajudante Cao Man, executam em pleno templo Shaolin o seu adversário suplicante. Sem qualquer piedade, os dois militares humilham os monges presos pelos seus princípios de pacifismo.

Fora do contexto militar, Hou Jie é porém um marido carinhoso e um pai dedicado sendo naturalmente recebido em herói pela sua família. Sempre à procura de novo equipamento, recebe dois ocidentais (indeterminados) que lhe prometem umas metralhadoras topo de gama em troca da autorização para construir umas linhas de caminhos-de-ferro. Era sem contar com o patriotismo de Hou Jie que expulsa os estrangeiros e castiga o seu ajudante por ter sido tentado por tão vil proposta.

Por outro lado, quando Hou Jie é convidado para negociar o casamento da sua filha com o herdeiro do seu melhor amigo, o general Song, Jie resolve aproveitar a ocasião para comanditar o seu homicídio. O feitiço vira contra o feiticeiro quando o seu ajudante, frustrado por ter sido humilhado frente aos caucasianos, atraiçoa o seu superior. Conseguindo fugir in extremis da armadilha, Hou Jie chega ao templo Shaolin com a sua filha mortalmente ferida.

Como terão já percebido esta é uma história de redenção budista. Por ser uma temática interessante mas já bastante explorada o sucesso do filme dependia principalmente da sua execução (tanto de guião como marcial). Infelizmente, Benny Chan entrega aqui uma confecção bastante insossa. Se o princípio do filme é de facto conseguido em termos de narrativa, a transição do mau Hou Jie para o monge Hou Jie incomoda pela sua ingenuidade que roça o cretinismo. Apesar dos esforços visíveis de Andy Lau em transmitir credibilidade à sua personagem o seu perfil de louco sádico não se adequa de forma alguma com o seu papel de pai de família nem credibiliza a sua redenção fulgurante.
 Os monges são por sua vez bastante fracos tanto marcialmente como tridimensionalmente. Sei que é difícil induzir personalidade num monge que jurou envergar pela neutralidade emocional mas o conjunto de homens de Shaolin parecem fingir mais a sabedoria do que a encarnar. Aliás estamos bem longe da apatia emocional já que os monges se aproximam mais da postura de uma criança do que aquela de um ser iluminado pelo saber de Buda. Uma menção especial para Jackie Chan que interpreta aqui um monge anedótico tanto marcialmente como individualmente. A lenda está mais sábia (velha) e a sua participação física no filme é um exemplo disso.

Já que falamos de “perfomance” posso dizer que o filme está muito aquém daquilo que um filme desta dimensão deveria apresentar. Demasiados artifícios visuais irrealistas, coreográficas simpáticas mas sem surpresa, os monges já foram dignificados muito melhor em inúmeras ocasiões. Quando os monges não lutam, podemos contar com o antagonista principal interpretado pelo bonitão Nicholas Tse e o seu conjunto de manchus assassinos saídos do nada. O rapaz perdido em longas poses de puto emo faz o papel do vilão caricato mas sempre sexy.

Sem querer revelar nada sobre o final do filme. Fiquei de facto perplexo com a interpretação histórica de um evento parcialmente inspirado em factos verídicos. Sem querer revelar demasiado, limito-me apenas a dizer que envolve “diabos brancos”.

Apesar da sua relativa popularidade “O novo templo Shaolin” é a meu ver um blockbuster caricato e pobre em acção. Os ares da China continental parecem ter “betisado” o Benny Chan que realiza aqui um filme muito longe da qualidade das suas produções anteriores.

Nota: 3/6 

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Villain (Akunin)



Realizador: Sang Il Lee
País: Japão
Ano: 2010
Elenco: Satoshi Tsumabuki, Eri Fukatsu, Masaki Okada, Hikari Mitsushima, Kirin Kiki, Akira Emoto, Sansei Shiom, iMansaku Ikeuchi, Ken Mitsuishi, Kimiko Yo, Hisashi Igawa…

Confesso ter há já alguns anos um certo preconceito em relação ao cinema japonês. Sem querer mexer agora na ferida (afinal só preciso de uma introdução) posso dizer que após um excelente 13 Assassins o cinema nipónico dá mais um passo para a nossa reconciliação com este fantástico “Villain”.

O filme cruza os destinos de várias personagens. Yuichi é um rapaz introvertido que vive numa pequena aldeia com a sua avó. Atormentado pelo seu complexo de inferioridade, o jovem percorre as estradas num bólido tunning e procura o amor em sites de encontro. É através da internet que o seu destino se cruza com o de Yoshino, uma rapariga obcecada pela vida urbana, que trabalha num emprego sem futuro e que procura satisfazer o seu apetite sexual prostituindo-se ocasionalmente através dos seus encontros online. Yoshino apenas sonha com um rapaz: O rico, belo e popular Masuo. O rapaz de ouro é na realidade um monstro de frieza e crueldade que iniciará, involuntariamente, uma longa corrente de ódio.

No dia em que Yuichi se desloca para a capital na esperança de reencontrar Yoshino, essa deixa o pendurado e prefere seguir o desinteressado playboy. Humilhado, Yuichi arranca o seu veículo e percorre as estradas enraivecido: No dia seguinte Yoshino é encontrada morta junto a berma da estrada.
 Enquanto tudo aponta para a culpabilidade de Yuichi, o jovem conhece através da internet uma nova rapariga, a tímida e pura Magome. Próxima vitima ou nova história de amor? A incerteza predomina sobre a origem do culpado.

Villain é um filme de “personagens”. Um filme carregado pela emoção de cada individualidade que através do sofrimento, amor ou desprezo, colidem os uns contra os outros desencadeado uma corrente de acontecimentos trágicos. O filme questiona os conceitos do bem e do mal colocando-os em paralelo com os sentimentos do amor e do ódio, demonstrado que a línea que separa os dois é estreita. Essa abordagem ao polémico “crime passional” é tão corajosa como perturbadora… Por vezes ingénua e por vezes sublime.

Desde a dignidade dos idosos paralisados pelo luto até as ambições sentimentais de uma juventude obcecada pela outra metade de um amor não correspondido, tudo aqui impressiona pelo sublime. O “Mal” surge como um elemento contagioso onde a dependência amorosa de um é utilizada para aliviar as frustrações sádicas de outro. No topo dessa corrente reside o homem sem coração, aquele que vive na sombra do seu egoísmo.

Por outro lado o filme estabelece o contraste ao apresentar uma história de amor passional entre dois seres que se encontrão demasiado tarde. Essa segunda dimensão do filme é infelizmente uma das suas fraquezas por ser excessivamente idealista e ingénua, por vezes até de forma indecente.  

O elenco faz aqui um trabalho fantástico especialmente na parte dos familiares. Akira Emoto no papel do pai devorado pela perda da filha e Kirin Kiki que procura desesperadamente salvar o seu neto e sobreviver ao olhar cruel da opinião pública, são comovedores de realismo e nobreza até ao ponto de roubar o protagonismo aos actores principais. Uma visão que nos faz recordar em muitos aspectos o excelente “Mother” de Joon Ho Bong.

O realizador está também de parabéns pela mestria dos planos que conseguem mais do que uma vez surpreender e fascinar pelo seu poder artístico. Esse lirismo visual é completado pelo magnífico tema principal da banda sonora composto por Joe Hisaishi.

No que se refere aos aspectos menos positivos, podemos destacar algumas fraquezas na relação entre Yuichi e Magome que acabam por estender demasiado filme (2h20). O realizador acumula as oportunidades de “finais” e parece não conseguir abandonar a sua obra o que resulta numa conclusão amenizada pelas vagas sucessivas de clímaxes emocionais.  

Tudo isso não impede o filme de atingir a excelência e de gratificar o espectador com a pele de galinha que só os grandes filmes conseguem transmitir. Há aqui Alma, há aqui Arte: Tudo aquilo que procuramos numa experiência de Cinema.  

Nota: 5/6

Excepcionalmente não colocarei aqui nenhum trailer por este ser um autentico "spoilfest" (revela demasiadas coisa). Podem consolar-se com o fantastico tema principal.
 

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Detective K: Secret of Virtuous Widow


Realizador: Seok-Yun Kim
País: Coreia do Sul
Ano: 2011
Elenco: Myung-min Kim, Dal-su Oh, Ji-min Han, Jae-yong Lee

Hoje em dia a “Sétima arte” consiste menos na exultação de uma mente criativa do que de uma encomenda oportunista de um gabinete de investidores. Depois de visionar o trailer, Dectective K não parece fazer qualquer mistério sobre as suas inspirações e quase podemos ouvir através da banda sonora plagiada, o conjunto de produtores jubilar com a ideia de uma versão coreana da adaptação de Sherlock Holmes por Guy Ritchie. O gimmick era mais do que apetecível e a aposta parecia promissora.

Em 1793 o poder real Coreano é flagelado pela fuga aos impostos (As coisas boas nunca mudam). Para perseguir os culpados, o rei contrata o primeiro detective da história, um homem à lógica e perícia sem falha conhecido como Detective K. Pensando ter resolvido mais um caso, o Sherlock Holmes Coreano é vítima de um complô que envolve off-shores mediáveis, tráfego de arte falsificado e genocídio religioso. É com a ajuda de um sem abrigo domador de cães que K procura inocentar-se e encontrar os verdadeiros culpados.

O “filme pipocas” não é um género ao qual estou necessariamente alérgico. Tendo nascido na década de 80, sou naturalmente seduzido por aquelas aventuras familiares reminiscentes das produções comerciais da altura. Infelizmente, Detective K aproxima-se mais do comercialismo de um Tomb Raider do que o de um Indiana Jones.

Apesar de algumas boas ideias e de uma produção de qualidade, o filme sofre pelo seu humor pesado e o seu moralismo saloio por vezes particularmente intrigante no que se refere à sua obsessão com o Cristianismo. Os saudosistas do Confucionismo podem poupar a sua banda larga, o filme coloca no Cristianismo todas as virtudes da sociedade moderna, democrática e igualitária. Esse elemento poderá distrair alguns mas esse acaba por não ser o centro do problema.

Quem aprecia narrativas policiais valoriza particularmente a lógica e criatividade que conseguem esconder até aos últimos momentos todos os mistérios do filme. Detective K falha redondamente esse objectivo e desenvolve lógicas confusas e arbitrarias para servir uma intriga extremamente previsível. Esse problema torna o filme demasiado aborrecido para cumprir a sua função essencial: entreter. O humor infantil tanto agrada como cansa e nós faz pensar mais no Inspector Gadget do que no héroi de Conan Doyle. Sem ser uma tortura, a energia do princípio do filme perde-se rapidamente e abandona o espectador num mar de indiferença.

Os actores são o ponto positivo do filme e nota-se claramente o esforço de cada um para dinamizar o perfil da sua personagem e amplificar a qualidade das peripécias. O esforço poderia ter feito um bom episódio de 40 minutos mas nunca um filme de 2 horas.

Em conclusão, Detective K: Secret of Virtuous Widow é um filme intermédio que se mastiga sem entusiasmo e se tecla com um “Meh”. Esperemos que a sequela profetizada no final do filme seja capaz de fazer honra ao potencial carismático do Detective K.

Nota: 3/6


terça-feira, 26 de julho de 2011

Welcome to Shama Town


Realizador: Wei Ran Li
País: China
Ano: 2010
Elenco: Honglei Sun, Chiling Lin, Lichun Lee, Jian Ma, Haibo Huang, Bingkun Cao, Wei Gan

Se existisse uma evolução natural ao género da comédia, o humor chinês (continental) estaria colocado algures entre os Three Stooges e o Camilo de Oliveira. Inútil dizer que o olhar ocidental, gasto pela subversão, digere particularmente mal esta mistura de “slapstick” com trocadilhos inofensivos e previsíveis. Se acrescentarmos para mais a dimensão extremamente popular e auto-centrada, o humor do Império do Meio parece estar condenado ao limbo das incompreensões culturais.

Ainda assim, filmes como Welcome to Shama Town marcam timidamente a evolução do género para um registo mais semelhante ao humor "progressista" de Hong Kong.

Chefiada por um presidente da câmara tão ambicioso como ingénuo, a vila de Shama é um “cu de judas” perdido no deserto chinês. Todos os dias os aldeões desempenham performances patéticas para turistas inexistentes na esperança de converter o local num famoso parque de diversões. Tudo isso por causa de uma lenda segundo a qual um ilustre ladrão teria enterrado lá a sua opulenta fortuna acumulada ao longo dos anos. Diariamente ameaçado pelo presidente regional que quer reconverter a aldeia na produção de tomates, Tang, o presidente da câmara, resolve apresentar alguns objectos encontrados a um conjunto de especialistas em antiguidade na esperança de popularizar a região. Os antiquários espantados pela descoberta fingem o seu desinteresse e organizam com um líder da máfia local uma burla para sacar aos habitantes de Shama o seu tesouro inestimável.

Com um estilo bastante peculiar, o realizador Li Wei Ran apresenta uma produção sincera que aposta na originalidade. Entre as paisagens de “faroeste” e o folclore de um vestuário Kustorica, o filme surpreende visualmente e atrai pela sua estética não convencional num universo cinematográfico tradicionalmente muito formatado. Sem ser um panfleto político, Welcome to Shama Town coloca em oposição os sonhos dos pobres abandonados do interior com o cliché moderno do milionário patético. Entre o taiwanês hipócrita e o megalómano que se dá o luxo de chefiar um chinês de 2m, uma pop star e um caucasiano, o filme faz a caricatura de uma China moderna, ridícula pelo seu “novo-riquismo” e que contrasta com a sinceridade e ingenuidade brilhantemente interpretada por Hong Lei Sun (Tang).

Sem ser hilariante, com severas quedas de ritmo, o filme acumula as imperfeições que condenam Welcome to Shama Town, apesar do esforço, a manter-se modesto enquanto poderia ter sido muito mais. Li Wei Ran, na sua primeira realização, assina um filme simpático que augura do melhor para o futuro do realizador… O percurso é grande para chegar ao nível de um Kung Fu Hustle mas não é de certo inalcançável.

Nota: 3.5/6


segunda-feira, 25 de julho de 2011

Open to Midnight


Realizador: Lo Kim Wah
País: Taiwan
Ano: 2011
Elenco: Pang Yu Man, Ha Yue Kiu, Lee Wai

Esta pequena odisseia pessoal que iniciei há dias atrás rege-se sobre poucos princípios. Dentro da abundante lista de filmes que só serão apreciados por expatriados asiáticos, resolvi demonstrar grande abertura tendo apenas posto de lado as inumeráveis comédias românticas do tipo Drama (Telenovela). Esse julgamento é principalmente feito com base nos cartazes bastante identificáveis de tais produções. No caso de Open to Midnight, quis pegar no filme que me parecia menos atractivo pela sua aparente falta de orçamento ou estereótipos identificáveis. Nada me preparava para esta comédia romântica terrorífica.

Antes de mais, este filme é mau. Por mau entendemos um nível que não associamos geralmente ao cinema ou sequer ao género que associamos às excentricidades “virilistas” de um domingo de TVI. Não meus amigos, este nível de infame é bem maior e como tal é necessário que as próximas palavras sejam postas em perspectiva: Dentro do género da novela descerebrada taiwanesa, Open to Midnight é mau.  

O filme conta a história de um jovem casal que resolve instalar-se na casa de um avô falecido algures numa aldeia perdida. Tal como o seu falecido vovô, Hai, o rapaz do casal, é fotógrafo e decide por isso renovar o negócio. O que os nossos dois amigos citadinos não suspeitavam é que a casa e a aldeia são assombradas por um grupo de fantasmas castiços. A coabitação pacífica torna-se problemática quando um vilão promotor imobiliário, de blaser rosa choque, resolve comprar a aldeia para a reconstruir.

O elenco é previsivelmente composto por pseudo vedetas que não apresentarei (actores de telenovela/cantores/maquinas publicitarias) e corresponde a todos os critérios de “qualidade” de tal produção. O rapaz apresenta um impressionante capacete capilar e uma articulação que desafia o rapaz de “is this real life”, a rapariga histérica chora todas as suas frases, o casal de fantasmas (comic relief) contracena com um peso que envergonharia o Batatoon e o triangulo amoroso acaba num nirvana de lamechice daqueles que fariam crescer pelos nos tomates do Nicholas Sparks.

Dentro das suas singularidades, o filme choca principalmente pela sua câmara cocainómana que não recua perante qualquer plano e transita de cena em cena a uma velocidade que faria passar o Michael Bay por Manoel de Oliveira.

Se o filme se tivesse contentado no seu registo humorístico e assumidamente infantil a coisa poderia ter sido… normal dentro do género. Infelizmente era sem contar os 20 minutos finais e o seu ultra-romantismo delirante e completamente assumido (parte mais assustadora do filme).

Não posso com certeza recomendar este filme. Os masoquistas antropólogos -que eu bem conheço- poderão ter talvez aqui algo para dissecar.

Nota: 0,5/6 


sábado, 23 de julho de 2011

The Fourth Portrait



Realizador: Chung Mong-Hung
País: Taiwan
Ano: 2010  
Elenco: Leon Dai, Hao Lei, King Shih-Chieh, Terri Kwan

O cinema de autor Taiwanês é tendencialmente mais discreto do que o seu homólogo da “terra principal”. Os realizadores da ilha democrática tornam-se certamente menos boémios sem nenhuma sharia política em cima de cabeça.

O retrato deste “the fourth portrait” é porém um olhar acusador que desafia a indiferença da Formosa perante as micro sociedades de miséria compostas pelos fugitivos da China continental. Para avaliar a sujidade humana nada melhor do que mergulhar a inocência imaculada de uma criança e tirar-lhe o retrato à saída.

Eu que esperava, pelo cartaz, uma versão taiwanesa do verão de Kikujiro estava muito enganado. Poucos são os alívios fantasistas para o pequeno Xiang.

Com 10 anos de idade, Xiang vê o seu pai morrer num hospital rural na maior indiferença. Deixado ao abandono, a criança foge a atenção dos adultos que não o procuram. Era sem contar com o rude mas generoso funcionário da escola que entrega o pequeno aos cuidados da “relaxada” assistência social. Entregado à mãe, uma prostituta casada com um feirante falido e violento, Xiang recorda o seu passado e o seu irmão misteriosamente desaparecido. Entre o seu crescimento escolar e a sua amizade com um rufia patético mas generoso, Xiang cresce e aproxima-se perigosamente de um segredo que ninguém parece querer recordar.

O discreto realizador Mong-Hong Chung assina aqui o seu segundo filme. Uma obra sincera e pessimista sobre a vivencia dos chineses na ilha que não assenta em nenhuma estrutura para além dos acasos da vida. Perante tanta sinceridade as críticas surgem dificilmente apesar de o filme não ser perfeito. Todos os actores brilham pela sua interpretação, com menção especial para o padrasto interpretado por Leon Dai e o seu monólogo paranormal. O pequeno Xiang, interpretado por Bi Xiao Hai (primeiro filme), é por vezes demasiado posto de lado perante os poderosos monólogos dos adultos que o rodeiam e acabamos por sentir falta da sua frescura. Talvez seja esse o castigo reservado para o espectador: Xiang não é o centro da sua vida e como tal não pode sempre ser o centro do filme.

Sofrendo de algumas lentidões, The Fourth Portrait é ainda assim um ensaio poderoso e pessimista: Recomenda-se.

Nota: 5/6

sexta-feira, 22 de julho de 2011

The Showdown


Realizador: Park Hoon-Jung
País: Coreia do Sul
Ano: 2011
Elenco: Park Hee-Soon, Jin Goo, Ko Chang-Seok,Kim Kap-Soo, Jang Hee-Jin, Jeon Kuk-Hwan,Choi Il-Hwa

A “vendeta enclausurada” é um dos pilares fundamentais da economia sul-coreana à semelhança da indústria da cortiça em Portugal. Desde as pancadarias de deputados na assembleia passando pela reguada marcial do professor, o cinema coreano não poderia deixar de transcrever em todos os contextos históricos, passados e futuros, este amor genuíno pela arte da porrada libertadora.

Por enclausurado entendemos aqui o galicismo cinematográfico “huis clos”: a arte de filmar indivíduos encerados num mesmo espaço (definição resumida). Um termo cujo preciosismo colide certamente com a sonoridade big Mac do título, The Showdown, e o seu cartaz de arte marcial xunga. Nada de asiáticos voadores nesta produção sul-coreana, apenas homens devorados pelo remorso e a sua ausência de liberdade.

Em 1619 (Dinastia Ming) um punhal de soldados coreanos resiste ao ataque do poderoso exército Manchu algures no norte Siberiano chinês. Sem hipóteses de vitória, o batalhão é chacinado sobrevivendo apenas três soldados: Dois amigos da aristocracia e um plebeu desertor. Presos na tempestade de neve, todos encontram refúgio numa albergaria abandonada. Entre o passado de traições dos dois amigos e o plebeu destinado à morte pelo crime de deserção, os três sobreviventes tornam-se aliados de circunstância e inimigos pela sua condição.

The Showdown pela sua sinopse aparentava ser umas daquelas apetecíveis iguarias coreanas. Se o filme consegue de facto transmitir uma grande tensão no inferno escuro do universo polar, o resultado sofre pelas repetidas interrupções coloridas do passado excessivamente bucólico das personagens. Num bom “huit-clos” os segredos não se apresentam em longas cenas lamechas, declamam-se! Estas interrupções constantes entediam e desconectam constantemente do efeito claustrofóbico tão precioso ao espectador. Para além do mais, com 1h51, os “flashbacks” surgem como um recheio grosseiro para atingir a meta simbólica da duração dos filmes profundos.

Traições por ambição, amor ou sobrevivência fazem parte da ementa sem grande surpresa mas com grande eficiência. Nesse aspecto, e mesmo com uns diálogos nem sempre conseguidos, os realizadores coreanos são mestres. O filme demonstra alguma originalidade ao abordar, com uma certa desilusão, a crueldade do jogo político e as suas consequências trágicas nas vidas dos seus súbditos.

Os três actores principais desempenham o seu papel sem brilho mas com solidez, um pouco à medida do resultado final. Em termos de produção apenas o mandarim patético dos soldados Qing e a banda sonora low cost destoam.

Em conclusão, The Showdown, ao soprar o quente e o frio, resulta num filme morno que poderia ter conseguido muito mais. Colocar no contexto medieval uma temática tão própria ao cinema coreano era sem dúvida uma boa ideia que merecia mais sinceridade e maturidade. O espectador deverá armar-se em paciência para digerir estas duas horas recheadas de sucessos e fracassos para um resultado final que satisfaz mas que não impressiona. O filme recomenda-se para todos aqueles que se deixaram seduzir pela sinopse. Este não será o melhor filme das vossas vidas mas será certamente um bom paliativo enquanto aguardam pela próxima bomba made in Hang guk.  

Nota: 3.5/6

 
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