terça-feira, 27 de setembro de 2011

Moon


Realizador: Duncan Jones
País: Britânico  
Ano: 2009
Elenco: Sam Rockwell, Kevin Spacey, Dominique McElligott, Robin Chalk, Matt Berry 

Falar de Moon sem revelar demasiado sobre o seu conteúdo é tarefa difícil. Poderia muito simplesmente dizer que é recomendável a qualquer fã de ciência ficção filosófica mas tentarei aqui ser o suficientemente vago para preservar o filme, e suficientemente explicito para transmitir a minha opinião sobre o mesmo.
Moon é o primeiro filme do realizador Duncan Jones. Apesar do seu destaque em diversos festivais de ciência ficção, o filme nunca chegou a brilhar no box office ou até chegar sequer às salas de cinema. Moon é uma iguaria que se aprecia egoistamente em DVD como uma pérola encontrada no meio dos filmes mais recentes do Steven Seagal ou Van Damme. A qualidade é porém de outro planeta para não dizer lua.

Num futuro indefinido os problemas energéticos da humanidade desapareceram após a descoberta de uma fonte de energia na lua. Essa nova matéria abundante e eficiente é explorada por uma multi-nacional Coreana chamada Sarang. Através de uma base espacial e de diversas máquinas escavadoras a empresa transporta o precioso carburante. Sam Bell é o único humano envolvido no processo no solo lunar. Com 3 anos de contrato prestes a acabar nas próximas semanas, o homem sofre de um longo isolamento que a companhia do seu afável robô não consegue atenuar. A sua mulher está prestes a deixar-lhe e a sua filha não para de crescer longe da sua presença. Como se isto não fosse suficiente, o astronauta sofre de alucinações cada vez mais presentes. Durante uma visita de inspecção Sam sofre de uma alucinação e acaba por embater numa das escavadoras. Enquanto parecia estar condenado, o astronauta acorda na base. Um despertar que revelará ser para a verdade.

Interpretado por Sam Rockwell, a personagem principal é o centro de uma reflexão psicológica sobre o isolamento, o papel da vida humana e a sua possível instrumentalização pelas empresas através das novas tecnologias. O autêntico pesadelo emocional é por vezes de tal forma carregado que o actor e o guionista demonstram uma certa impotência na comunicação do drama. As revelações são de tal forma cruéis que essas bastariam para acabar o filme em poucos minutos. A necessidade de progressão na narrativa é no fundo o principal defeito de um filme globalmente excelente.

Há poesia em Moon. Há um discurso terrivelmente actual com o qual muitos se poderão identificar pois apesar da complexidade científica da situação essa não passa de uma versão mais absurda e violenta do sentimento de alienação tão próprio ao princípio deste Século XXI.  
O filme é longo, sofrido e fatalista. A sua homenagem evidente ao filme de Kubrick, 2001: Odisseia do Espaço, expressa-se aqui no papel contraditório da inteligência artificial GERTY “interpretada” por Kevin Spacey. A máquina que comunica emoções através de smileys é terrivelmente humana em contraste com a corporação que emprega o Sam. Como se a condição de exploração dos dois criasse uma solidariedade entre a maquina e o homem.  No final do filme Sam proclama para a máquina que os humanos não são programados ao contrário dos robôs. Uma frase ambígua que oscila entre reflexão panfletária e ironia sobre a condição humana.

Em conclusão, apesar de uma série de pequenos defeitos, Moon surge como um bom filme de ciência ficção por conseguir transmitir novos horizontes de pensamento. Não apenas pela tecnologia mas pelas consequências provenientes da mesma. É sem dúvida com filmes destes que a ciência ficção expressa o seu real potencial.

Nota: 4/5 

O que o Kermode disse sobre o Moon:

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Top 15 REM


Para comemorar o fim dos REM resolvi organizar um Top. Nada de palavreados o meu objectivo é apenas recordar os êxitos da carreira da banda organizados por uma ordem de preferências.
Enjoy!


15. So. Central Rain


14. Hollow Man


13. The great beyond


12. Drive


11. Fall on Me

10. It’s the end of the World

9. Leaving New York


8. Man on The Moon


7. Bad Day


6. Imitation of Life


5. The one I love


4. Shiny Happy People


3. Daysleeper


2. Losing my religion


1. Everybody Hurts

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

The Warring States

Realizador: Chen Jin
País: China 
Ano: 2011
Elenco: Sunhong Lei, Francis Ng, Tian Jing, Hee-seon Kim, Zige Fang, Enhe Feng, Degang Guo, Huang Haibing, Hao Hao, Yunwei He, Wu Jiang, Waise Lee, Kesheng Lei, Jingsheng Liao, Yajin Liu, Jinwu Ma, Hai Mao

O simples título extremamente genérico de “O período dos Estados combatentes” surpreende pela sua ambição. Duas horas para narrar esse período longínquo e incrivelmente denso da História da China? Resumir num filme toda a diversidade dos mitos populares e teorias históricas que se foram acumulando sobre esse período? Com cerca de mais de 200 anos de histórias e batalhas entre os seus numerosos reinados, a tarefa parecia demasiada herculeana para ser honesta.

Isto é claro antes de vermos o filme pois muito depressa nos apercebemos que este “The Warring State” não é nada mais do que uma interpretação da alegada biografia do estratega Sun Bin, aprendiz de GuiGu Zi e descendente directo do famoso Sun Zi, o escritor da “Arte da Guerra” (aquela bíblia para os sócios dos esquemas em pirâmide). Pegar numa personalidade de reduzida importância e coloca-lo como estandarte do seu período inteiro é no mínimo atrevido no máximo estupidamente ganancioso. De forma a legitimar o seu título, o filme procura fazer do Sun Bin um figura lendária e messiânica numa romantização historicamente escandalosa.

A história conta as peripécias do Sun Bin, um brilhante estratega militar surpreendentemente ingénuo e brincalhão. Reconhecido como o herdeiro da sabedoria do seu famoso mestre Gui Gu Zi, é disputado pelas duas potencias que são o Reino de Qi e o Reino de Wei. Apaixonado pela bela general Xi do Reino de Qi e fiel ao seu “irmão” militar do Reino de Wei, Sun Bin vai ver o seu pacifismo ser posto à prova pela loucura dos senhores de guerra que procuram opter o seu saber.

 O elenco conta maioritariamente com actores pouco conhecidos para além do experiente Sun Hong Lei que interpreta aqui o papel de Sun Bin e Francis Ng no papel d Pang Juan. Habituado aos papéis do bom ingénuo Sun Bin surge aqui como uma espécie de buda gansado (sem gansa) e caricato. Apesar de a personagem não beneficiar da melhor escrita sente-se uma certa preguiça por parte do Sun Hong Lei que já brilhou muitas vezes dentro deste registo. Pang Juan, irmão de formação e vilão pelas circunstâncias é sem dúvida a personagem mais interessante. Embora o cinema de Hong Kong tenha dado melhores oportunidades de expressar o seu talento, Francis Ng consegue impregnar uma certa subtileza e singularidade à sua personagem. Os outros actores fazem o seu papel convenientemente sendo que a tradicional princesa insossa, a general Xi, é interpretada com o cuidado suficientemente para a tornar suportável. Na verdade os actores são talvez o melhor que o filme tem para oferecer.

Habituado aos dramas amorosos, o realizador Chen Jin muda ao seu gosto a história original, transformando o general original numa mulher para fazer dela o ponto central de um romance trágico. Alterna a sequência dos acontecimentos assim como desfecho das personagens o que acabará certamente por exasperar os amantes da História da China.

O filme oscila entre o piroso o mais insuportável e raros momentos de apreciável sobriedade. A história original, por ser cativante, consegue transmitir um pouco da sua qualidade ao filme o que acaba por salvar o resultado final do desastre. É na execução que o “The Warring States” desinteressa e aborrece pela presença lamentável de numerosas palermices que se encontram ao longo do filme. O princípio do filme faz aqui figura de exemplo com os seus 30 minutos indigestos em todos os níveis. Alternam-se as cenas ao retalho e sem qualquer anexo. Os planos de câmara são incompreensíveis e a falta de meios tornam risíveis as batalhas de CGI e o seu nível gráfico da primeira playstation. Chen Jin não parece estar sequer interessado nas componentes marciais de um filme, que na essência, relata o duelo de dois génios da guerra. Não que isto seja algo imprescindível, mas a falta de paixão nas cenas de guerra, inevitáveis ao olhar de qualquer produtor, tornam o filme particularmente pesado. O mesmo se aplica ao humor cretino e meloso presente ao longo do filme. Mas tudo isso, nota-se, não preocupa minimamente o realizador, pois é no Drama que o filme tenta, em vão, justificar a sua existência como obra de Arte. Essa arrogância é manchada pelo fracasso da omnipresença de clichés e de efeitos que embaraçariam o maior ultra-romancista da TVI e que não conseguem desviar a atenção do espectador para aquilo que não é nada mais do que uma produção demasiado amadora para satisfazer.

A vida de Sun Bin merecia certamente melhor tratamento do que essa tentativa de fazer da personagem uma espécie de reincarnação do “Confúcio in Love”. É portanto preferível optar pela descrição do Wikipedia do que por este “The Warring States”. Pouparão tempo e ficarão melhor informados.

Nota: 2/6 

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Tekken


Realizador: Dwight H. Little
País: USA
Ano: 2010
Elenco: Jon Foo, Kelly Overton, Cary-Hiroyuki Tagawa, Ian Anthony Dale, Tamlyn Tomita, Candice Hillebrand, Luke Goss, Gary Daniels, Mircea Monroe

Resolvi dar uma pequena pausa aos filmes asiáticos visionando um filme plenamente inspirado numa arte em que os japoneses excelam: Os videojogos. Os filmes adaptados de jogos de combate não representam qualquer novidade e parecem ter-se tornado num género próprio. Filmes dos 90 como o Street Fighter do Van damme ou o Mortal Kombat do Christophe Lambert representam para muitos um prazer culpado que se aprecia por critérios muito próprios. Esses parâmetros subtis definem a diferença que separa o estatuto de filme de culto do primeiro Mortal Kombat do estatuto de bosta lendária de Mortal Kombat 2. Obviamente tal apreciação só poderá surgir numa mente juvenil altamente pervertida pelos filmes de kung-fu low budget e pelos famosos action heroes que são o Steven Seagal, Chuck Norris ou Jean Claude Van Damme. Apesar da minha pertence a esse grupo de virilistas xungas ser muito parcial, julgo entender suficientemente os códigos do género para fornecer uma opinião crítica capaz de ir para além do mau que é inerente a esse tipo de filme. Os que aguardam por um milagre podem desde já abandonar qualquer esperança, o filme é tão mau como qualquer outro filme do género.

Na altura em que a adaptação do Tekken foi anunciada ninguém parecia estar à espera dele. Se o filme tivesse visto a luz do dia 7 anos mais cedo o impacto teria sido claramente diferente mas numa altura em que a série mostrava já claros sinais de declínio e o filme do Dead or Alive tinha nos feito jurar para nunca mais, poucos foram os que se entusiasmaram pela notícia. Os próprios filmes de videojogos, gastos pelos sucessivos fracassos, são já condenados a mediocridade pela opinião pública.

O videojogo do Tekken é por sua vez um franchise bastante reconhecível para todos aqueles que viveram os tempos da primeira playstation. Grandemente inspirado pelos Virtua Fighters, o jogo revolucionou os padrões instigados pelo Street Fighter e tornou-se num mito no mundo dos videojogos. Apesar dos guiões dos jogos de luta serem habitualmente bastante maus, Tekken surpreendia pelo seu universo tanto grotesco como complexo. O dilema familiar do império Mishima só poderia ter comparação com as piores telenovelas mexicanas. Pandas guerreiros, Kangurus assassinos com luvas de boxe, lutadores Americanos com penteados que desafiam a gravidade, robôs plágios de Frankenstein, samurais mascarados como no carnaval e nativas americanas de ascendência chinesa são algumas das figuras folclóricas que animam as complexas e hilariantes aventuras do universo do “punho de ferro” (Tekken). Um material tão grotesco não poderia certamente ter acabado nas mãos dos estúdios cinematográficos por qualquer outro motivo do que o simples desejo de conseguir dinheiro fácil.

Voltando à minha introdução, resolvi expor esta adaptação aos critérios que julgo serem os principais factores de sucesso ou fracasso do género: A fidelidade ao universo, a caracterização das personagens e a qualidade dos combates.

O filme introduz um futuro apocalíptico onde os governos e os seus Estados caíram progressivamente em declínio mergulhando o mundo no caos. O poder caiu num punhal de grandes multinacionais que agem como ditaduras e fazem figura de únicas garantes da paz. A mais preponderante dessas empresas é a Tekken, uma potência comercial liderada pela família Mishima e que tem como particularidade o seu torneio anual de artes marciais, o chamado “King of Iron Fist”. Jin Kazama é por sua vez o filho único de uma mãe solteira que tenta sobreviver, como todos os jovens, a um universo hostil onde os seus conhecimentos de artes marciais são a sua melhor vantagem. O dia em que a mãe do Jin é violentamente assassinada pelos soldados do Tekken, o rapaz descobre a ligação da sua mãe ao império marcial dos Mishima e resolve integrar o torneio na esperança de a vingar.

Os mais experientes terão desde já reparado na flexibilidade com que o vocabulário da série foi aplicado. A famosa Mishima Zaibatsu é aqui intitulada pelo nome japonês do torneio enquanto a tradução faz aqui ofício de título oficial. Esse detalhe relativamente insignificante não deixa porém surgir uma primeira falha de grande importância: O conceito de Zaibatsu. O wikipedia sendo o melhor amigo dos que ainda não sabem, essa designação japonesa é importante para entender o poder do mitos desses monopólios induzidos e a sua filiação com antigas famílias samurais. Num país maioritariamente governado ao longo da sua história por uma nobreza marcial, a noção de um império económico liderado por uns malucos da porrada é certamente mais contextualizada para não dizer compreensível. Porém querer transcrever essa subtileza sem querer preservar a sua auto-derisão era certamente missão impossível. Nesse aspecto o filme safa-se razoavelmente sem porém nunca conseguir justificar a importância desmedida do torneio na liderança da população.

A fraqueza do filme nesse aspecto reside principalmente na forma como tudo é encerado no mesmo espaço e a forma como as personagens se deslocam nesse mesmo espaço de um sítio para o outro sem grandes justificações ou consequências. Os combates organizam-se numa arena modernizada à semelhança do que poderíamos esperar de um UFC futurista e pouco mais. As necessidades orçamentais terão certamente condicionado essa decisão mas não a justificam de forma alguma.
Uma imagem vale mais do que mil palavras

A caracterização das personagens é por sua vez a maior fraqueza do filme. Primeiro porque o punhal de lutadores escolhido deixa de fora muitos dos mais memoráveis e segundo porque o seu desenvolvimento limita-se à simples aparência. O desenvolvimento pessoal é praticamente inexistente. Jin é interpretado pessimamente e não transmite nem emocionalmente nem fisicamente qualquer carisma. Heihachi Mishima, tradicional filho da “meretriz”, é aqui uma espécie de Mr Myiagi que apesar dos notáveis esforços do lendário Hiroyuki Tagawa é terrivelmente debilitado pela sua caracterização patética. Quem vislumbrar a coroa de cabelo branco e as sobrancelhas desproporcionadas só poderá concluir que a equipa do filme estará próxima da cegueira. Essa incapacidade em distinguir os elementos de caracterização indispensáveis dos dispensáveis está presente em quase todas as personagens. Kazuya é aqui o perfeito oposto do seu pai por ser completamente irreconhecível em relação à sua representação no jogo.

Por outro lado, os trajes no filme não representa, nada mais do que uma farda colorida à imagem do que se faz no Wrestling. No jogo quase todos os combatentes possuem uma profissão paralela à sua actividade de lutador. Todos são animados por objectivos individuais e a sua personalidade assim como interacção são bastante singulares. Fora a Cristie Monteiro, que faz aqui o papel de love interest e primeira mulher a fazer do seu rego um decote, todas as personagens são psicologicamente semelhantes e com diálogos que não dizem nada sobre a sua personalidade. O filme do Street Fighter, apesar de o fazer de forma ridícula, conseguia pelo menos transmitir personalidades próprias a cada personagem.

Resta-nos então a questão dos combates. O que diferencia principalmente o filme adaptado de um jogo de luta com um filme de “action-heroes” tipo bloodsport reside principalmente na ausência de “perfomance”. Apesar dos movimentos dos lutadores serem de facto inspirados no jogo, nada os torna particularmente entusiasmantes tanto na encenação como no seu valor marcial. Fora o breve intervalo de capoeira do mítico Eddie as sequencias de acção são previsíveis sem nunca porém caírem no falhanço total. Tendo em conta as adaptações já existentes, o filme situa-se na média inferior. O que as fazem serem inferiores aos combates de um Mortal Kombat deve-se precisamente ao facto do cenário dos combates ser sempre o mesmo. A utilização dos elementos externos e a transição da floresta para o “inferno” na luta entre o Johnny Cage e o Scorpion no Mortal Kombat são exemplos de elementos que amplificaram a percepção positiva do combate. Essa ilusão ausente no Tekken teria permitido criar mais suspense e cortar com uma certa monotonia.

Em conclusão o filme Tekken está longe de revolucionar o nível qualitativo das adaptações de jogos de luta. Surge como um parasita fora do tempo que não destoa com as produções passadas mas que sofre da sua contemporaneidade tanto no padrão cinematográfico como na popularidade da própria licença. O filme consegue ainda assim escapar ao aborrecimento e é portanto recomendável aos fãs da saga desde que esses o façam por aquelas vias que enfadam os direitos de autor.

Nota: 2/6 




terça-feira, 23 de agosto de 2011

Gothic & Lolita Psycho




Realizador: Gô Ohara
País: Japão
Ano: 2010
Elenco: Rina Akiyama, Misaki Momose, Asami, Fumie Nakajima, Ruito Aoyagi, Yukihide Benii, Satoshi Hakuzen, Masahiro Okamoto, Yurei Yanagi

Quando o melhor traseiro japonês de 2007 (título oficial) encontrou o caminho do “director artístico” (coreógrafo de lutas) de Onechanbara e do videojogo Devil May Cry 3 o arquipélago japonês escavou mais profundamente o buraco cultural da sua pop culture mais rasga e cretina. Como já referi em críticas anteriores sofro na verdade de um grande preconceito perante as produções nipónicas que se situam algures entre o “live-action” e o gore série Z. Isso não quer dizer porém que sou incapaz de apreciar a loucura particular que se tornou o produto de exportação numero 1 dos nipónicos, antes pelo contrário, é precisamente por gostar dessa faceta que as caricaturas baratas e gananciosas surgem-me como totalmente desprezáveis. Como se em perda de inspiração o japonês não soubesse produzir mais do que a visão disturbada de uma cultura que ele próprio já não entende e tenta imitar por recursos patéticos.

Gothic & (será o “&” pertinente?) Lolita Psycho é o segundo filme de Go Ohara após o catastrófico mas sincero Geisha vs Ninjas. Tem como protagonista a idol (modelo apreciada para além do saudável) Rina Akiyama que interpreta aqui outra figura do folclore japonês: uma Gothic Lolita. Para os não familiarizados - os familiarizados terão que desculpar a minha apresentação breve logo incorrecta - o termo designa a casta urbana que adoptou como moda uma versão “atomizada” das tradicionais bonecas vitorianas. Um movimento que, diga-se de passagem, anda em forte perda de velocidade mas que pelo efeito jet-lag tem sido bastante promovido pelas novas adeptas do Oeste na secção bizarra da comunicação social. Apesar do cálculo idiota desta espécie de sandes XXL preparada para um guloso de Kakoi (fixe em Japonês) sabemos que o conceito tem trazido produções de série B engraçadas tais como Tokyo Gore police ou Robotgeisha. A linha complexa que separa a excelência de um grind movie deve-se acima de tudo a qualidade dos seus diálogos, a originalidade do seu universo e ao profundo sentido de espectáculo que faz do “non-sense” algo entusiasmante e coeso no seu próprio contexto.  

O guião conta a história de uma rapariga que, pelo filme, vivia feliz num apartamento de branco integral com os seus pais carinhosos. No dia dos seus anos eis que surge um conjunto de assassinos encapuçados, bem decididos em estragar a festa, e que assassinam violentamente a mãe e deixam o pai tetraplégico. Anos mais tarde a figura paterna converte-se a versão “Van Hellsing” do Cristianismo e resolve com a sua filha vingar-se dos 5 assassinos. Sem saber bem como, Yuki, a filha do casal mudou o visual e tornou-se numa maquina de matar especialista do guarda-sol rococó com lamina afiada. O filme conta a história desses 5 combates à maneira de um beat-them-all (videojogo).

Para todas as componentes de Gothic & Lolita Psycho surgem referencias de nomes e obras que conseguiram fazer aquilo que o filme falha redondamente. A máfia gore do inicio do filme relembram o Ichi the Killer, a sucessão dos combates relembram o Scott Pilgrim VS the World, a dimensão vingativa relembram o Kill Bill, o “gore xunga” relembram o Tokyo Gore Police… Tantas referencias que surgem como os bons exemplos dos maus exemplos compilados no filme.  Fora algumas boas ideias no início todo o resto desaponta e entedia tanto em termos de ambiente como nos combates. As coreografias tornam-se depressa pouco diferentes de qualquer “sentai” (género dos power rangers). As tentativas de humor são pesadas e servidas por um painel de indivíduos que brincam aos actores e dos quais a actriz pornográfica Asami (Machine gun girl) faz o melhor trabalho o que diz muito sobre o nível global do elenco. Rina Akiyama é transparente na sua interpretação à semelhança do Arnold Schwarzenegger dos primeiros dias: Queremos o corpo! Fica calada e mono expressiva o teu corpo fará o resto! Uma estratégia que o realizador terá certamente aprendido na rodagem do péssimo Oneechanbara.

Essa transparência é de facto um fenómeno que atinge a produção por inteira devida a total falta de desenvolvimento das personagens. Quem são eles? Que propósito defende a organização? Quem formou a Gothic Lolita? Quem eram os seus pais? Que defende ela? Qual é o papel dos demónios nessa equação? Quem é o conjunto de estrangeiros bosozoku? O que raio era aquele bar/discoteca/casino/fight club/club SM homossexual do princípio do filme?... Tantas perguntas para um filme que se quer um “no brainer” humorístico e que acaba por não ser bom nem na seriedade nem na paródia pois focaliza-se apenas na “porrada” sem deixar espaço para nada mais.

Não poderia ter melhor veredicto do que a profunda e incontrolável sonolência que me caiu em cima passado 30 minutos desta bosta que é Gothic & Lolita Psycho. Os amadores de filmes de série B podem poupar os seus minutos para outros filmes pois este filme não é nada mais que um mau sentai infantil gore. Quanto as Gothic Lolitas essa poderão muito bem dispensar o filme pois a heroína anda com a mesma roupa o filme todo. Uma heresia para um filme de "Lolitas". 

Nota: 1/6   

 

sábado, 20 de agosto de 2011

Empire of Assassins


Realizador: Xiao Du
País: China
Ano: 2011
Elenco: Miu Tse, Li Yuan, Ji Chun-Hua , Xie Miao

Existem maus filmes chineses… Aliás existem muito maus filmes chineses... Mas filmes como Empire of Assassins são sem dúvida um caso à parte. Algures no abismo cinematográfico do cinema de série B encontram-se produções modernas que desafiam o prazer culpado das produções retro e apresentam-se universalmente más seja o espectador um torturado estudante de filosofia ou um organismo unicelular fã do Jean-Claude Van Damme.

O filme conta a história de murros e pontapés que são recepcionados por posturas defensivas sendo seguidas por mais murros e pontapés. Para intercalar esse intercâmbio de membros humanos projectados a grande velocidade, vislumbra-se brevemente uma história confusa de vingança e um triângulo amoroso. Poderia debruçar-me mais sobre o guião mas tal seria fazer aquilo que o próprio filme não tentou.

Com uma qualidade de produção de telenovela dos 90 e um painel de actores que gritam por um papel nos Morangos da TVI, o filme é uma sucessão de longos minutos de combate. Nada de performances à la Ong Bak mas antes o loop de um resgate dos Power Rangers ou qualquer recriação do combate San Goku – Vegeta no recreio de uma escola primária. Na verdade o filme não esconde muito tempo as suas intenções e a minha surpresa só se deveu ao beneficio concedido pelo cartaz de aspecto razoável. Lançado em DVD nos Estados Unidos imagino que muitos amantes do Jet cairão na armadilha instalada por uns distribuidores sem consideração pelo consumidor e pela imagem da China no mundo. Recomendamos assim as críticas dos consumidores mártires do Amazon.com:   http://www.amazon.com/Empire-Assassins-Miu-Tse/dp/B004WSA4CK/ref=sr_1_1?ie=UTF8&qid=1313880691&sr=8-1)

Tendo dito isso só nos resta saber se o filme chega a atingir o grau tão subjectivo do “tão mau que é bom”. A meu ver essa ocorrência é apenas visível nos 30 primeiros minutos do filme e no fim descaradamente precipitado. Sendo assim o filme recomenda-se em fast-forward a todos os masoquistas do grau zero cinematográfico. 

Nota: 0.5/6



terça-feira, 2 de agosto de 2011

Heartbeat


Realizador: Yoon Jae Geun
País: Coreia do Sul
Ano: 2011
Elenco: Yunjin Kim, Park Hae-il, Jeong Da-hye, Park Ha-yeong, Kim Min-kyeong-I, Joo Jin-mo-I

A actriz Yunjin Kim tornou-se com o sucesso da série Lost uma espécie de Joaquim de Almeida Sul Coreana. Um exemplo de sucesso num país que coloca em grande estima tudo o que os “Americanos” representam culturalmente e que acaba por projectar para o estrelato alguém que tinha passado por uma carreira relativamente morna no seu país de origem. Heartbeat coloca essa heroína do bilinguismo em oposição com um dos rapazes do “The Host”, Hae Il Park, num braço de ferro emocional organizado por um antigo publicitário que realiza aqui o seu primeiro filme.

O filme conta a história de uma viúva endinheirada (perdoam-me o pejorativo) que luta para encontrar um dador para a sua filha que sofre de um coração frágil. Enquanto a patologia da sua pequena ganha proporções extremamente preocupantes, um taxista rufia recebe a notícia de que a sua mãe entrou em morte cerebral. Sem nunca ter tido consideração pela sua progenitora para além de a assimilar a um multibanco com pernas, o ingrato descobre que a sua fortuna era uma mentira que encobria um lucrativo transplante de órgãos. Enquanto a conceituada directora de uma escola privada inglesa (perdoam-me mais uma vez o pejorativo) descobre que a mãe do taxista é uma dadora compatível, esse muda opinião e resolver manter a mãe em “vida” depois de essa ter mexido os dedos. O filme retrata o combate desses dois obstinados que se afundam progressivamente na loucura enquanto usam de todos os meios sujos para conseguir manter em vida o seu ente querido.

Como o indica o cartaz, Heartbeat apresenta-se como uma bomba lacrimal que pretende sem qualquer vergonha colmatar a progressiva falta de água (problema ecológico) com torrentes de lágrimas. Se o filme tem por base um conceito particularmente interessante o que dizer da forma e insensatez com que Heartbeat destrói qualquer bom senso para conseguir os seus picos de histerismos emocionais?! A meu ver estamos perante uma espécie de guião de “pornografia emocional”. 
Ao seja um filme que é tão focalizado num aspecto que acaba por desleixar o resto ultrapassando alegremente os limites da racionalidade.

Da mesma forma que um picheleiro ser recebido por duas bissexuais em lingerie é a premissa altamente improvável que justifica a fornicação descarada do filme pornográfico, o guião de pornografia emocional não recua perante nada para fornecer o seu drama. Se um unicórnio cor-de-rosa salvar um povo fantasista é algo relativamente tolerável num filme como as Crónicas de Narnia, o que teríamos dito se tal criatura tivesse salvado o povo judeu na Lista de Schindler? Essa hipérbole caracteriza-se em Heartbeat pela forma como o tema do tráfego de órgãos, a organização dos serviços de saúde, da polícia e alguns aspectos sociológicos são chacinados pelas necessidades de um Frankenstein da dramaturgia. Lamentamos muito mas a emoção que envolve temas sérios não beneficia do estatuto de imunidade de uma erecção pornograficamente induzida (conhecida no cinema convencional como táctica Megan Fox).

Por outro lado, Heartbeat não deixa de ser um bom porno emocional no sentido em que os actores se torturam em êxtases de sofrimento que costumam curar-se com prémios de festivais. Tendo em conta a frieza de interpretação de Yunjin Kim em Lost muitos ficarão surpreendidos por ver a gueixa da ilha perder-se em tormentas de pathos dignas da Senhora das Dores. 
Nesse duelo dos actores dramaturgos Hae Il Park (o taxista) vence sem dificuldade pela subtileza da sua impressão que se deve também em parte pelo lado menos unidimensional da sua personagem. 
Enquanto o espectador tenta digerir a baboseira das mecânicas somos apanhados de surpresa pela qualidade dos conflitos violentos que envolvem as duas personagens principais. Já não assistia a tal montanha russa desde o District 9 (guião de filme pornográfico de esquerda).    

Nota: 3/6

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Shaolin


Realizador: Benny Chan
País: China – Hong Kong
Ano: 2011
Elenco: Andy Lau
, Nicholas Tse, Fan Bingbing, Wu Jing,Yu Shaoqun, Jackie Chan

O filme de arte marcial é sem dúvida o género mais popular do cinema asiático no ocidente. Quem não recorda a tremenda popularidade dos filmes do Bruce Lee na década de 70 assim como o percurso de outras grandes estrelas como Jackie Chan ou Jet Lee. Essa longa vaga de produção made in Hong kong aculturou progressivamente o ocidente às artes marciais e aos famosos monges budistas do templo Shaolin. Com um casting de estrelas, um realizador vedeta e um orçamento consequente tudo indicava que este seria um dos grandes blockbusters chineses do ano (e é muito provável que assim aconteça).

Existem a meu ver dois tipos de filmes de artes marciais chineses: O da China lendária e o da China “moderna” (1700-2000). Na minha opinião o primeiro género é menos interessante em termos de marcialidade por envolver demasiados “bailes aéreos” mas é mais interessante pela sua carga poética e o seu conteúdo relativamente livre de propaganda. Por outro lado o segundo género apresenta muitas vezes autênticas “perfomances” marciais associadas a um guião caricato, revisionista e xenófoba dos “brancos” e dos japoneses.

Como tal abordei o filme com a mente aberta, pronto para ver um desfile de professores universitários americanos blasfemar o Stanislavski ao declamar frases de vilões de desenho animado. Desde que o espectáculo “circense” fizesse o seu trabalho a densidade de guião seria o pequeno extra para atingir o estado de graça conseguido pelo excelente Fearless.

O filme decorra algures no período decadente dos “Senhores de Guerra” (1916-1928), um tempo em que pequenos chefes militares se disputam território e dinheiro no meio de uma população aterrorizada e faminta. Hou Jie é um desses senhores de guerra. Arrogante, cruel e sem piedade, o homem é um general talentoso que ambiciona por cada vez mais poder. Triunfando sobre um dos seus rivais, Hou Jie e o seu jovem ajudante Cao Man, executam em pleno templo Shaolin o seu adversário suplicante. Sem qualquer piedade, os dois militares humilham os monges presos pelos seus princípios de pacifismo.

Fora do contexto militar, Hou Jie é porém um marido carinhoso e um pai dedicado sendo naturalmente recebido em herói pela sua família. Sempre à procura de novo equipamento, recebe dois ocidentais (indeterminados) que lhe prometem umas metralhadoras topo de gama em troca da autorização para construir umas linhas de caminhos-de-ferro. Era sem contar com o patriotismo de Hou Jie que expulsa os estrangeiros e castiga o seu ajudante por ter sido tentado por tão vil proposta.

Por outro lado, quando Hou Jie é convidado para negociar o casamento da sua filha com o herdeiro do seu melhor amigo, o general Song, Jie resolve aproveitar a ocasião para comanditar o seu homicídio. O feitiço vira contra o feiticeiro quando o seu ajudante, frustrado por ter sido humilhado frente aos caucasianos, atraiçoa o seu superior. Conseguindo fugir in extremis da armadilha, Hou Jie chega ao templo Shaolin com a sua filha mortalmente ferida.

Como terão já percebido esta é uma história de redenção budista. Por ser uma temática interessante mas já bastante explorada o sucesso do filme dependia principalmente da sua execução (tanto de guião como marcial). Infelizmente, Benny Chan entrega aqui uma confecção bastante insossa. Se o princípio do filme é de facto conseguido em termos de narrativa, a transição do mau Hou Jie para o monge Hou Jie incomoda pela sua ingenuidade que roça o cretinismo. Apesar dos esforços visíveis de Andy Lau em transmitir credibilidade à sua personagem o seu perfil de louco sádico não se adequa de forma alguma com o seu papel de pai de família nem credibiliza a sua redenção fulgurante.
 Os monges são por sua vez bastante fracos tanto marcialmente como tridimensionalmente. Sei que é difícil induzir personalidade num monge que jurou envergar pela neutralidade emocional mas o conjunto de homens de Shaolin parecem fingir mais a sabedoria do que a encarnar. Aliás estamos bem longe da apatia emocional já que os monges se aproximam mais da postura de uma criança do que aquela de um ser iluminado pelo saber de Buda. Uma menção especial para Jackie Chan que interpreta aqui um monge anedótico tanto marcialmente como individualmente. A lenda está mais sábia (velha) e a sua participação física no filme é um exemplo disso.

Já que falamos de “perfomance” posso dizer que o filme está muito aquém daquilo que um filme desta dimensão deveria apresentar. Demasiados artifícios visuais irrealistas, coreográficas simpáticas mas sem surpresa, os monges já foram dignificados muito melhor em inúmeras ocasiões. Quando os monges não lutam, podemos contar com o antagonista principal interpretado pelo bonitão Nicholas Tse e o seu conjunto de manchus assassinos saídos do nada. O rapaz perdido em longas poses de puto emo faz o papel do vilão caricato mas sempre sexy.

Sem querer revelar nada sobre o final do filme. Fiquei de facto perplexo com a interpretação histórica de um evento parcialmente inspirado em factos verídicos. Sem querer revelar demasiado, limito-me apenas a dizer que envolve “diabos brancos”.

Apesar da sua relativa popularidade “O novo templo Shaolin” é a meu ver um blockbuster caricato e pobre em acção. Os ares da China continental parecem ter “betisado” o Benny Chan que realiza aqui um filme muito longe da qualidade das suas produções anteriores.

Nota: 3/6 

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